segunda-feira, 14 de janeiro de 2008

A ditadura do anti-merchandising

Quando se fala na Central Globo de Jornalismo, hoje, é muito comum ouvir que ninguém faz jornalismo como ela. Mesmo que só ela tenha uma infra-estrutura realmente apropriada para o periodismo (principalmente em relação à TV aberta), nota-se também algumas diferenças da Globo de hoje e daquela de 20 anos atrás. E não me refiro apenas ao natural processo de evolução pelo qual o grupo passou.

Há quase 24 anos, a TV Globo noticiava que a população paulistana foi à Praça da Sé, em peso, para comemorar o aniversário da cidade (que acontece em 25 de janeiro). Todos lembram que, na verdade, aproximadamente 1 milhão de pessoas foram protestar em um comício a favor das Diretas Já. Ninguém aguentava mais ficar sem o direito de votar para presidente. O último dito cujo escolhido pelo povo havia sido Jânio Quadros, no longíquo ano de 1961. Durou 7 meses no poder, renunciou, fi-lo porque qui-lo, e o resto da história foi o vice João Goulart assumir o poder, para ser destituído pela Junta Militar literalmente no Dia da Mentira de 1964.

Essa história ficou famosa na época ("o povo não é bobo! Fora Rede Globo!" era um dos bordões em alguns protestos sindicalistas)e também para aqueles que estudam jornalismo. A Globo de hoje não é mais, ainda bem, a Globo daqueles tempos. Tempos de um mão-de-ferro chamado Roberto Marinho, sempre alinhado com quem estivesse no poder, e que quando morreu ainda foi imortalizado como"jornalista" Roberto Marinho. Tem até uma avenida em São Paulo com esse nome, cujo antigo nome é Águas Espraiadas. Alguns estudantes, um tempo atrás, tentaram mudar o nome dela, à força, para Avenida Jornalista Vladimir Herzog. Seria mais apropriado. Roberto Marinho, goste-se dele ou não, sempre foi empresário, e não jornalista. Uma coisa que eu me lembro bem é que ele morreu exatamente um dia antes do meu primeiro dia de aula, no primeiro semestre, na faculdade de jornalismo.

Realmente, a Globo não é mais aquela. Mas a Globo de hoje também tem seus problemas. O que mais me incomoda, e que não existia há 20 anos, é a atitude de "nos veículos do grupo, não vamos falar (ou mostrar) nomes de marcas ou produtos que não patrocinam a Globo". O problema é que o Departamento de Marketing da empresa, ou seja lá quem for o responsável por isso, passa dos limites do bom senso. Aliás, chega até o bizarro, em determinados casos. Tenho três exemplos diferentes, todos ligados ao esporte. No primeiro, a empresa prejudica a informação e confunde o telespectador. No segundo, prejudica os atletas, nunca apoiados por ela. E no terceiro,prejudica seu próprio trabalho, estragando a imagem, desprezando coisas como enquadramento certo e etc, apenas para não mostrar uma certa marca. Essa última, para mim, é certamente a mais bizarra.

Uma briga energética

O fato da TV Globo ter 'inventado' uma nova equipe na F-1 também foi bem bizarro. Porque só para eles que a Red Bull vira RBR, imortalizada na voz de Galvão Bueno. A mesma coisa acontece com sua 'filha', a Toro Rosso. Não faz o menor sentido. Será que deveríamos começar a tratar a Mercedes apenas como "a fornecedora de motores da McLaren" porque a montadora não patrocina a Globo, por exemplo? Ou chamar a BMW de Bayerische Motoren Werke? É o que a sigla signica, mas pelo menos disfarçaria a marca. A Honda, por sua vez, poderia ser simplesmente"Equipe H".

Alguém pode argumentar que as montadoras são fundamentais para o automobilismo, pois fornecem peças, motores, além de, obviamente,montarem os carros. Mas... o que a Red Bull faz é exatamente a mesma coisa. Eles compraram uma estrutura, que era da antiga Jaguar, para montarem carros de corrida. Eles não são apenas patrocinadores. Têm uma equipe real de F-1, e merecem ser tratados como tal, não importa se a Globo passe ou não comerciais dos energéticos.

Nesse caso, a Globo erra duas vezes. Primeiro, por tentar enganar seu telespectador. Ou pelo menos desvirtuá-lo, fazendo o anti-merchandising. Talvez uma pessoa que assista à F-1 pela primeira vez na vida não saiba que a tal da RBR é uma formada pelo grupo Red Bull. E mereceria saber porque isso é uma informação extremamente relevante. Enquanto isso, o fanático pela categoria sabe que a RBR é a Red Bull e se sente um idiota quando o Galvão solta essa sopa de letrinhas. Isso tudo às custas do Departamento de Marketing, que é muito mais importante que o consumidor, logicamente. Informação de cal é ralo.

Só para lembrar: a Benetton, marca de roupas italiana, teve uma equipe na F-1 entre 1985 e 2001, comprada posteriormente pela Renault. Foram dois títulos de pilotos com o Schumacher, em 94 e 95. A escuderia sempre foi conhecida como Benetton. O Galvão sempre falou "Benetton". Ainda bem que era assim. Nessa hora, da até saudade da Globo daqueles tempos.

Um adendo final a esse episódio particular. A Red Bull criou aquela corrida de aviões lá, chamada de Red Bull Air Race. Eles até voaram no Rio de Janeiro no ano passado, se eu não me engano na Baía de Guanabara. A Globo achou o esporte suficientemente interessante para destacá-lo em sua restropectiva de 2007.

Pena que eles resolveram inventar de novo. E chamaram o evento apenas de "Air Race". É mais um desses absurdos. Os caras criaram o negócio, meu deus. O mínimo que a Globo deveria fazer era creditá-los e chamar o evento pelo seu nome adequado. Ou então não noticiá-lo. O mais engraçado é que o Sportv transmitiu algumas corridas da Red Bull Air Race, com sua denominação 'original'. Para mim, é um mistério.

Mistério esse que não deveria ser explicado, e sim resolvido. A temporada 2008 da F-1 está para começar, daqui a dois meses. Mas depois desse tal de "Air Race" na retrospectiva, já perdi minhas esperanças de que o Galvão solte um "e lá vem um carro da Red Bull!".

Como esse post já ficou gigante demais, as outras duas histórias ficam para o próximo, na quarta ou na quinta-feira.

Enquanto isso, pense nesse negócio do anti-merchandising.

2 comentários:

Anônimo disse...

Fala Tufos!

Muito interessante esse post.

Os caras são muito caras de pau mesmo. É ridículo quando alguém faz algo acontecer e sequer é creditado. Passo aqui quase todos os dias pra ver se tem coisas nova...
Ps: Ainda bem que acabou a parte do Rush. kkk. abraços! Rods

L-A. Pandini disse...

Só li agora... Preciso, digno de cirurgião. A postura da emisora é irritante, arrogante, aviltante, mas bastante coerente com o "jornalismo" que ela sempre fez.